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1001 pequenos nadas...

...que são tudo, ou apenas esboços da essência de uma vida entre as gentes e as coisas, captados pelo olhar e pela mente livre, curiosa e contemplativa. Por tudo isto e tudo o resto: É PROIBIDA A ENTRADA A QUEM NÃO ANDAR ESPANTADO DE EXISTIR

1001 pequenos nadas...

...que são tudo, ou apenas esboços da essência de uma vida entre as gentes e as coisas, captados pelo olhar e pela mente livre, curiosa e contemplativa. Por tudo isto e tudo o resto: É PROIBIDA A ENTRADA A QUEM NÃO ANDAR ESPANTADO DE EXISTIR

Preciso de ti

Os filhos não precisam da presença física dos pais 24h por dia. Precisam sim de disponibilidade e entrega no tempo que existe, seja ele qual for, e de carinho, estímulos positivos e regras, mais do que brinquedos, chocolates ou qualquer outra coisa material.

E precisam de ouvir, as vezes que forem precisas; “és a coisa mais querida do mundo!”, “És a melhor coisa que me aconteceu."

Mário Cordeiro

 

   O J.N. é um menino de 11 anos que ainda está no 3º ano e de quem parece que toda a gente tem dificuldade em gostar. Diagnosticado com um grave quadro de hiperactividade com défice de atenção, é movido a comprimidos que procuram acalmar o excesso de energia que traz dentro de si.    O J. N. é um furacão - de energia, de sentimentos, de revolta, de raiva, de mau comportamento, de tudo o que menos se gosta numa criança e que a torna o alvo fácil de acusações e discriminações, ou o elo mais fraco, porque quando algo corre mal, se o J.N. está presente, a culpa é do J.N., sejam miúdos ou graúdos a emitir a sentença.

   Mas o J.N. também é um menino cheio de sonhos, inocência e vontade de ser tudo e capaz de tudo. E como todos os meninos, o J.N. gosta de ser gostado, de se sentir gostado e, por isso, o J.N. é um menino carente e ávido de atenção e afecto.

   O J.N. é aquele menino que muitos rotulam de "mau" e sem "capacidade de socializar" mas que sempre que me vê corre para mim, abraça-me e pede-me "Posso estar contigo hoje?" enquanto me oferece gomas e rebuçados que tem no bolso.

   O J.N. é aquele menino que muitos evitam e "impossível de ter em casa, na escola ou no ATL" mas que enquanto ouve um sermão de grupo na sala do ATL onde também não o compreendem procura a minha mão como quem procura abrigo da chuva e não a larga senão depois de muitas insistências da minha parte. 

   E podia ficar aqui horas a dar exemplos de como o J.N. e todos os outros meninos como o J.N. que existem são crianças com crescimentos complicados, são crianças que dão trabalho, são crianças que cansam e por vezes nos levam à loucura, mas são, acima de tudo crianças que estão a tentar dizer-nos algo e esse algo é, muitas vezes, "preciso de ti". 

 

Mais feliz e mais triste do que nunca

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 «Se eu tivesse uma máquina», disse eu, «todos os dias te tirava uma fotografia. Assim havia de lembrar-me como tu és todos os dias da tua vida» «Sou sempre igual.» «Não, não és. Estás sempre a mudar. Todos os dias um bocadinho. Se eu pudesse, guardava um registo de tudo.» «Já que és assim tão esperto, diz-me lá em que é que eu mudei hoje?» «Para já, estás uma fracção de milímetro mais alta. O teu cabelo está uma fracção de milímetro mais comprido. E os teus seios estão uma fracção de...» «Não estão nada!» «Isso é que estão» «NÂO estão.» «Estão, estão.» «E que mais, seu grandessíssimo ordinário?» «Estás um bocadinho mais feliz e um bocadinho mais triste.» «Quer dizer que se anulam mutuamente, deixando-me exactamente na mesma.» «Nem por sombras. O facto de estares um bocadinho mais feliz hoje não altera o facto de também estares um bocadinho mais triste. Todos os dias te tornas um bocadinho mais triste e feliz, o que significa que agora, neste preciso momento, estás mais triste e mais feliz do que alguma vez estiveste em toda a tua vida.» «Como é que tu sabes?» «Pensa lá bem. Alguma vez te sentiste tão feliz como agora, deitada aqui na relva?» «Acho que não.» «E alguma vez te sentiste mais triste?» «Não.» (...) «Então e tu? Estás mais feliz e mais triste do que nunca?» «Claro que sim.» «Porquê?» «Porque nada me faz mais feliz nem mais triste do que tu.»

"A História do Amor", Nicole Krauss

Menos pedras e mais sorrisos

   Isso de juntarmos as pedras que encontramos no caminho para construirmos um castelo é uma grande treta. Já gostei disso. Já valorizei as coisas más que nos acontecem como licões e aprendizagens, numa de "o que não nos mata torna-nos mais fortes". Mas a vida e as pessoas têm me ensinado que o importante e o que realmente nos ensina a viver e continuar por cá apesar de tudo e em qualquer circunstância, são as coisas boas que a vida tem. 

   Não acreditando na felicidade plena, acredito em momentos felizes e cada vez mais acredito também que são esses instantes, esses momentos, que nos fazem, nos alimentam, nos ensinam a viver e nos permitem construir castelos ou muralhas ou fortalezas para enfrentarmos os momentos menos positivos que a vida também nos vais oferecendo. 

   Alimentar (alimentarmo-nos) das pedras no caminho não é viver; é carpir as nossas mágoas; é não avançar; é entrar numa espiral de lamentações e negativismo tão própria do ser humano que não nos permite avançar, não nos permite viver e não nos deixa valorizar esses momentos felizes que nos enchem os dias, a alma e coração. Por isso, esqueçam as pedras no caminho! Não se preocupem em juntá-las porque vos parecem excelente matéria prima para uma fortaleza humana e emocional. Agarrem nos momentos felizes, nas coisas boas da vida, nas pessoas, nos cheiros, nos sabores, nos sons, nos gestos, em tudo o que vos faz sorrir e construam-se enquanto pessoas satisfeitas, plenas, completas e capazes de enfrentar tudo e todos, sem castelos ou barreiras de pedras. O sorriso é, sempre, a nossa maior e melhor arma de guerra e de vida!

 

Uma palavrinha aos habitantes daquela aldeia de Vila Flor que adora gatos...

   Para aqueles animais que chamam ritual ou tradição ao infeliz, vergonhoso, lamentável e desumano episódio de colocar um gato fechado num qualquer recipiente pendurado num poste a arder e ainda têm a grandessíssima lata (para não usar outro palavreado aqui) de afirmar orgulhosos e contentes que o bichinho não sofre, quando todos o vimos a fugir com o pêlo a arder, eu gostava de deixar uma sugestão: e que tal se, só assim para nos certificarmos das coisas e experimentarmos algo novo, e até quem sabe mostrarmos que gostamos tanto de animais que queremos passar pelo que eles passam, vos fechassemos num barril de madeira, pendurados num poste a arder, e esperassemos que caissem ao chão e conseguissem escapar?? Ah! Mas com o mimo de sairem do barril com o corpo em chamas, que assim a festa fica bem mais animada!!! Então que tal?? Bora lá experimentar??? Candidatos??? Um de cada vez, por favor! Vão ver que estar fechado em qualquer lado enquanto vos chegam fogo não é a maior diversão que uma festa pode proporcionar. 

   Mas por favor avisem-me do dia em que isso vai acontecer. É que eu quero estar lá a assistir e faço questão de me certificar que saem de lá a arder mesmo, porque tudo o que não vos provoque sofrimento e dor desumanos não é castigo suficiente. 

   

«Não se encontra o que se procura», Miguel Sousa Tavares

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A escrita, a viagem, a memória, a vida fora da espuma dos dias, a descoberta, o apelo do desconhecido, o instante em que tudo pode acontecer, tudo isto está no novo livro de Miguel Sousa Tavares.
Nesta viagem fora do seu quarto, o autor transporta-nos ao seu mundo mediterrâneo, ao sul de Portugal, à Croácia, a Roma, à Sicília, ao Brasil e aos lugares da História por onde passaram figuras gigantes. No regresso a casa, explica a razão da sua escrita. A sós, com as palavras, viaja para dentro de si para partilhar aquilo que só os grandes contadores de histórias sabem fazer, seguindo o lema: "Viajar é olhar".

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   Gosto de Miguel Sousa Tavares. Gosto da escrita de Miguel Sousa Tavares. E gosto de o ler em modo "crónicas". Posto isto, este livro só me poderia agradar. E agradou. Bastante. Uma escrita tão natural quanto o nosso pensamento. Está tudo lá. Está todo ele lá. Simples, direto, nem sempre consensual, mas sincero. 

   Gosto de Miguel Sousa Tavares. Ponto. 

`Cause we all have wings...

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"Tenho pena dos homens que não têm asas para voar por cima das coisas más". Escreveu Sophia de Mello Breyner no seu conto da Fada Oriana. 

A verdade é que todos nós temos asas. E citando desta vez uma música dos INXS de que gosto bastante "I told you that we could fly. `Cause we all have wings, but some of us don`t know why". As nossas asas, essas que nos permitem, não voar por cima dos problemas, mas lidar com eles, ultrapassá-los ou, simplesmente, aprender a viver com eles, estão lá. Estão cá. Connosco. Em cada um de nós. Chamem-lhes asas, força interior, resiliência, capacidade de lidar com os problemas, super-poderes... chamem-lhe o que quiserem, mas as asinhas estão connosco. Poderão estar escondidas, esquecidas, atrofiadas pela falta de uso, mas estão em nós, porque não há ninguém, absolutamente ninguém, que perante a mais difícil das circunstâncias, perante o mais terrível dos problemas, não seja capaz de lidar com ele, ultrapassá-lo. A vida e o mundo estão cheios de exemplos de pessoas excepcionais com umas asas magníficas que permitem tudo e tudo conseguem. Não façamos dessas pessoas modelos mas sim uma inspiração e a confirmação de que realmente "we all have wings" e de que, nesta vida ou em qualquer outra, não há nada, rigorosamente nada, com a qual o ser humano não seja capaz de lidar. 

 Façam o favor de abrir as vossas asas!

Primeiro dia de Verão

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E eis o primeiro dia de Verão, que vejo chegar no meio dessa suave neblina das manhãs na Foz do Porto. A cada Verão que começa, lembro-me sempre do que dizia RIlke: "Só o Verão merece ser vivido". Eu sempre pensei o mesmo, mas o Verão para mim, é o do Sul, do calor sem tréguas, das sombras das árvores ou das esquinas das casas caiadas, do azul translúcido do mar, do grito das cigarras durante o dia ou das rãs durante a noite, das sombras que o luar deixa nos jardins, quando a lua cheia e toda a vida parece uma promessa de felicidade.

Miguel Sousa Tavares, "Não se encontra o que se procura" 

Viajar

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Aqui eu aprendi que viajar é olhar. E, por isso, eu continuo a olhar, para que a viagem não acabe nunca. Sei que muitas vezes, talvez, a luz que guia o meu olhar apagar-se-á e o mundo ficará só de sombras. Porque nada é eterno, nem a luz, nem Roma, nem o esplendor dos dias felizes. Mas, mesmo então, fechando os olhos, eu direi, à maneira de Neruda: "Confesso que vivi". 

Miguel Sousa Tavares, "Não se encontra o que se procura"

Eu quero

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foto tirada na Foz d Douro, 10 Junho 2015

 Eu quero a vida inteira, quero olhar, escutar, sentir, lembrar-me. Quero a vida das pessoas e dos personagens, quero o cheiro dos lugares, a memória da luz, a consistência das coisas. Eu quero ouvir os que foram felizes, os que sofreram, os que traíram e os que sentiram a faca nas costas. Eu quero ouvir toda a tragédia, toda a grandezam toda a felicidade. Eu quero a vida como ela é. Quero contá-la, escrevê-la com as palavras que sempre chegam - quando me sento em frente à página em branco do computador e sei que tenho de escrever, porque não há nada melhor que eu possa fazer em troca de estar vivo. 

Miguel Sousa Tavares, "Não se encontra o que se procura"

Quando o sonho já não é mais capaz de comandar a vida

   Eu ainda sou do tempo em que o sonho era uma coisa tão concreta e definida como outra coisa qualquer e comandava a vida, como nos ensinou António Gedeão. Era tudo "if you dream, you can", "segue os teus sonhos" e outras do género que nos davam força ou garra para seguirmos em frente e conseguirmos aquilo que queriamos. 

   Infelizmente este paradigma está a mudar. Ou já mudou. Hoje em dia não é mais o sonho que comanda a vida; o que comanda a vida é algo bem concreto e definido como nenhuma outra coisa mais: o dinheiro. Não há mais, ou não dá mais, essa do "if you dream, you can"; agora é, definitivamente "if you have the money, you can".

   Em quantas coisas da nossa vida é o sonho que nos move e nos leva lá? Fizemos aquela viagem de sonho? Porque tivemos dinheiro para a pagar. Temos a casa com que sempre sonhamos? Porque tivemos dinheiro para a pagar. Temos o carro dos nossos sonhos mais precoces? Porque tivemos dinheiro para o comprar. Temos aquela peça de roupa ou aqueles sapatos que sempre desejamos ter? Porque tivemos dinheiro para os comprar. Casamos? Porque tivemos dinheiro para o fazer. E casos haverá até em que a nossa posição social ou profissional depende, até ela, de dinheiro. 

   Não é fácil vivermos nos tempos que correm. Sobretudo, não é facil acreditar que vale a pena continuar a sonhar e a lutar pelos nossos sonhos. Não é fácil, quando nos deparamos com todas as barreiras e dificuldades que a vida nos coloca e ainda mais as questões financeiras. Não é fácil aceitar que algo monetário, numérico, controle a nossa vida, os nossos passos, as nossas conquistas e até mesmo os nossos sonhos. 

   É por isso que eu desisti de sonhar. Mas calma! Não perdi a esperança e o gosto de viver. Simplesmente substituí os sonhos por objectivos, por metas pessoais, profissionais, sociais, emocionais, materiais e por aí fora. Sei o que quero, mas não sonho com isso. Caminho para lá chegar, passo a passo, dia a dia, sem ilusões, com toda a racionalidade possível e com muitas contas. 

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