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1001 pequenos nadas...

...que são tudo, ou apenas esboços da essência de uma vida entre as gentes e as coisas, captados pelo olhar e pela mente livre, curiosa e contemplativa. Por tudo isto e tudo o resto: É PROIBIDA A ENTRADA A QUEM NÃO ANDAR ESPANTADO DE EXISTIR

1001 pequenos nadas...

...que são tudo, ou apenas esboços da essência de uma vida entre as gentes e as coisas, captados pelo olhar e pela mente livre, curiosa e contemplativa. Por tudo isto e tudo o resto: É PROIBIDA A ENTRADA A QUEM NÃO ANDAR ESPANTADO DE EXISTIR

Continuar a correr pelo parque

os olhos das crianças escondem o segredo da continuidade, para uma criança nada do que dói a um adulto impede a sua corrida pelo parque, e o que falta aos adultos é sempre a capacidade de continuar a correr pelo parque mesmo quando as bombas começam a cair, mesmo quando o parque parece um pântano, mesmo quando o escorregão fica velho e ferrugento, mesmo quando o parque já não é bem um parque mas um pré-cemitério, o que falta aos adultos é a capacidade de continuar a correr pelo parque mesmo quando a morte cai à volta.

Pedro Chagas Freitas, "Queres casar comigo todos os dias?"

Neste exacto momento

Se parasses agora, agora mesmo, o tempo para sempre: serias feliz para sempre?

É esse o teste, a toda a hora, a todos os minutos, que tens de fazer: se o tempo parasse agora para sempre, neste exacto momento em que fazes o que neste exacto momento estás a fazer, serias feliz para sempre?

 

Pedro Chagas Freitas

«Queres casar comigo todos os dias?», Pedro Chagas Freitas

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  Não sei se quem já leu este livro também ficou com a sensação que ele parece escandalosamente autobiográfico... se não o é, ergo as minhas mãos ao céu por alguém conseguir escrever o amor com tanto sentimento e tanta força. Neste livro só há uma personagem: a Bárbara. E o amor. Se calhar é mesmo esta a personagem principal: o amor. Não há grande história, grandes desenvolvimentos, grande enredo... na verdade, tudo parece ou aparece meio solto, sempre com o amor como base, como sustento, como fundamente e como tudo. É um livro de Pedro Chagas Freitas. Claramente. Não é preciso dizer muito mais. Não é o tipo de livro que eu adore ler, pelo menos não de seguida. Vou lendo, até porque a inexistência de história assim o permite. 

   Para os meus gostos literários e para a minha personalidade casca dura chega a ser um livro pesado e demasiado...intenso, sentido,  amado. Chega a um ponto que é amor a mais, sentimento a mais, tudo a mais...não sei se queria ser amada assim por alguém capaz de sentir o amor assim como o escreve. 

   É um livro interessante. Ou melhor, é um livro com partes interessantes. Partes que dão que pensar. É Pedro Chagas Freitas, disso não há dúvida. 

aquele beijo mais quente que o verão...

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 vou acordar-te e dizer-te que te amo, passar pelo menos meia hora a ouvir-te respirar no meu ombro, depois tu vais passar pelo menos meia hora a ouvir-me respirar no teu ombro, depois vamos levantar-nos juntos, lavar os dentes juntos, fazer o brinde que fazemos sempre que lavamos os dentes, tchin-tchin, tchon-tchon, tchum-tchum, vamos beijar-nos mais uma vez, aquele beijo mais quente que o Verão, tem de ser, o que tem de ser tem muita força e neste caso até sabe bem, e finalmente vamos vestir-nos para casar,

eu vou vestir calções e tu o que bem entenderes, a surpresa faz parte do encanto, amo-te seja qual for a roupa que vestires, e sem roupa ainda mais, tenho de confessar,

quando sairmos de casa e antes de entrarmos no carro vou olhar-te nos olhos pela última vez solteira na nossa garagem, vou pedir-te que me faças o casado mais feliz do mundo porque já estou farto de ser o solteiro mais feliz do mundo, tu vais sorrir, não sei se vais segurar uma ou outra lágrima, vais abraçar-me e em silêncio dizer-me que me amas, eu vou acreditar, abraçar-te de volta e perguntar-te o que te vou perguntar mesmo depois de casarmos, a todas as horas em que precisar de sentir com palavras o que precisa de palavras - 

(diz que sim porque eu preciso de viver) queres casar comigo todos os dias?

Pedro Chagas Freitas, "Queres casar comigo todos os dias, Bárbara?"

Primeiro tu

Primeiro tu – depois os outros. Sim: primeiro tu – depois os outros. Diz comigo sem temeres ser atacado pelos velhos do Restelo, pelos politicamente correctos, pelos egoístas que querem domar (à imagem do seu egoísmo) o egoísmo: primeiro penso em mim, em eu estar bem comigo, em eu estar saudável, forte e feliz – e depois, sim, penso nos outros. Não porque sou – como podem dizer os tais que não vêem a ponta de um corno à frente dos olhos (ou melhor: os que só vêem a ponta de um corno à frente dos olhos) – um cabrão, um sacana, um egocêntrico. Não. Nada disso. Primeiro eu e depois os outros – porque só estando eu bem, saudável, forte e feliz é que poderei ajudar os outros a estarem exactamente como eu estou.

Pedro Chagas Freitas, "Eu Sou Deus"

«Eu Sou Deus», Pedro Chagas Freitas

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Desconcertante, Pedro Chagas Freitas ensina-o, no seu estilo irreverente e único, a olhar para o mundo de um ângulo completamente diferente. Um ângulo que elimina, sem misericórdia, conceitos e percepções que você julgava intocáveis.
EU SOU DEUS não é sobre fazer as coisas direitas - mas sim sobre ir ao encontro do seu direito. O direito a respirar, o direito a pensar, o direito a ser. O direito a viver.
EU SOU DEUS não é sobre aquilo que você não pode fazer - mas sim sobre aquilo que você pode, e deve, fazer. Você pode sentir medo, pode sentir inveja. Você pode sentir aquilo que o mundo insiste em dizer-lhe para não sentir. Você pode ser o seu mundo. Por isso: porque não mudar o mundo?
EU SOU DEUS não é um livro de auto-ajuda. Mas se você o ler pode auto-ajudar-se. Tenha cuidado.

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     Os excertos de crónicas de Pedro Chagas Freitas inundam as páginas sociais, por isso não admira que os seus livros vendam tanto. O estilo "crónica" não é o que eu mais gosto de ler; é daquelas coisas que vamos lendo, um bocadinho aqui um bocadinho ali, aproveitar pequenos momentos livres. PCF sabe escrever. É um facto. E sabe escrever sobre basicamente tudo. Ou se preferirmos, sabe escrever sobre tudo o que é a vida. Sem cair em dramatismos ou romantismos excessivos, as suas palavras fazem sentido e têm significado. É claro que tem os seus momentos de loucura e de vez em quando lá saem textos menos interessantes e até um pouco repetitivos, que nos fazem fechar o livro durante um dia ou dois, mas na generalidade há sempre algo de positivo para se retirar das suas palavras. 

   Um livro para ir lendo, saboreando, sublinhando e reflectindo. 

Subfelicidade

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O que mais dói é a subfelicidade. A felicidade mais ou menos, a felicidade que não se faz felicidade, que fica sempre a meio de se ser. A quase felicidade. A subfelicidade não magoa – vai magoando; a subfelicidade não martiriza – vai martirizando. Não é intensa – mas é imensa; faz gritar, sofrer, saltar, chorar – mas em silêncio, em surdina, em anonimato. Como se não fosse. Mas é: a subfelicidade é. A subfelicidade faz-te ficar refém do que tens – mas nem assim te impede de te sentires apeado do que não tens e gostarias de ter. Do que está ali, sempre ali, sempre à mão de semear – e que, mesmo assim, nunca consegues tocar. A subfelicidade é o piso -1 da felicidade. E não há elevador algum que te leve a subir de piso. Tens de ser tu a pegar nas tuas perninhas e a subir as escadas.

(...)

A subfelicidade é uma tristeza. Uma tristeza de hábitos, de rotinas, de sorrisos – uma tristeza que inibe a surpresa, o imprevisível, a gargalhada. Uma tristeza que te faz refém do que fazes e te impede de te seres o que és. Olha em redor: a toda a volta há pessoas subfelizes, pessoas que dizem “vai-se andando”, pessoas que dizem “tem de ser”, pessoas que dizem “eu até gosto dele”, pessoas que dizem “sou feliz” com os olhos cheios de “queria ser feliz”, pessoas que dizem “é a vida”. Mas não é. A vida não é a quase felicidade. A vida não é a subfelicidade.

Pedro Chagas Freitas, "Eu Sou Deus"

 

Ainda que nos (vos) custe admitir, a subfelicidade é o estado comum da maioria dos mortais. Temos momentos felizes, estados felizes, dias felizes, mas a maior parte do tempo conformamo-nos com o que a vida nos vai dando e, raramente, ou poucos de nós, passam de momentos de felicidade para uma vida de felicidade, que será, provavelmente, das tarefas mais difíceis (e desafiantes) desta existência. 

 

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Sê um construtor de momentos inesquecíveis, de momentos que vais querer, tal como quiseste vivê-los, recordar. Momentos que vais querer recordar incansavelmente, demencialmente. 

(...)

Sê, todos os dias, o dia que nunca vais esquecer  - o dia que vais para sempre recordar. 

Pedro Chagas Freitas, "Eu Sou Deus"

Sê fácil

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Manda uma cabeçada à Mike Tyson nas lérias que te ensinam a não seres fácil perante quem amas. Se amas: sê fácil. Abre os braços, abre as pernas, abre a boca: abre-te para quem amas. Se amas: não compliques. Se queres um beijo, beija; se queres um abraço, abraça; se queres um orgasmo, despe e sala e dança e sua e geme. Se queres amar: ama. Não olhes a convenções. Prefere as pulsões. Prefere os corações, as animações - até mesmo os neutrões. Liga-te à eletricidade, liga-te à corrente: sê a tua corrente. Esquece as cirrentes de pensamento que te fecham as portas, esquece as correntes de preconceitos que te ofuscam o desejo, esquece as correntes de medos que te castram o sentir. Se amas: sê fácil. 

Pedro Chagas Freitas, "Eu sou Deus"

Sai da fossa

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Se estás na merda, se alguém te magoou, se alguém te abandonou, se perdeste alguém que amas: não caias na treta de que é importante digerires a cena, na bullshit de que é decisivo que assimiles o que aconteceu antes de avançares. Manda encher de moscas os que te dizem isso. E sai. Sai da fossa. Lava-te bem lavadinho, veste-te bem vestidinho. E sai. Sai para a rua, para o mundo. Sai para a vida. Vai viver – antes de que sejas tu o que se perdeu e não aquele que ficou sem aquele ou aquela que se perdeu. Vai. Sai de ti, sai para lá – e sai de cá. Cá, o buraco, a depressão, o “chora que faz bem”, o “sofrer é bom para crescer” que vão dar banho ao cão. Eles que vão sofrer e que te deixem abdicar de sofrer como eles julgam que deves sofrer. Sofrer é sempre – por mais acompanhado que estejas, por mais por fora que estejas – a sós. És tu e o teu sofrimento. Tu e o que te dói. E o que te dói tem de ser, em ti, suportável: vivível. E o vivível, em alguns momentos, exige movimento: exige manobras de diversão. Exige que mandes bugiar a fossa, a necessidade de reflexão – e que te obrigues a estar em pressão: em de pressão. De pressão de agires, de fazeres, de correres, de saltares, de dançares, de cantares. Caga na fossa, na depressão, na música que te lembra o que foi bom e já não existe, nas memórias, nas fotografias, nas lágrimas que não param de correr. Corre, isso sim, tu. Corre para fora de ti – mesmo que nunca deixes de, com isso, mergulhares em ti. Esquece os paleios das psicochachadas da auto-descoberta, da auto-elevação, da importância das pedras no caminho. As pedras no teu caminho servem, mais do que para fazer um castelo, para atirares aos cabrões ou cabronas que te queriam ver fechado numa cave a chorar que nem um bebé abandonado.

Pedro Chagas Freitas, "Eu Sou Deus"