Por Pedro Rolo Duarte, na LuxWoman deste mês:
"(...) Acordo para esta sequência de ideias repetidas, feitas, corriqueiras, e percebo por fim o que se passa em Portugal: somos todos psicoterapeutas de todos os outros que são doentes como nós. Estamos deprimidos por inteiro - mas revezamo-nos nesta condição (...).
Andamos a reboque uns dos outros, desabafando no cabeleireiro ou no dentista, no advogado ou no balcão do café, tapando as nossas insuficiências com as insuficiências alheias, fingindo que somos o troféu de sensatez, e usando a velha máxima: «Faz o que eu digo, não faças o que eu faço».
Enquanto isso, os psicólogos devem viver a maior crise de sempre - porque há crise mesmo e porque qualquer taxista os substitui. Porque a sabedoria e o estudo de pouco lhes serve, qualquer profissional dedicado às madeixas e nuances, ou à barra do tribunal, pode fazer diagnóstico e respectivos caldos de galinha.
Sei que é absurda a ideia. Mas ela remete-me para o único momento (de que me lembro...) em que senti que estava a perder o pé à vida e não conseguia dominar a tristeza que sentia. Pedi ajuda. Aterrei num consultório de uma extraordinária psicoterapeuta (profissional, essa sim...) que, em poucos meses, me ajudou a desenhar o retrato dos meus dias, que teimavam em ser um puzzle solto numa caixa sem fundo. Fiquei-lhe grato para sempre, não apenas por me ter ajudado, mas também por ter desfeito mais um dos preconceitos que me acompanharam dezenas de anos e que enviava a psicologia para o campo da irrelevância. Eu fazia parte daquele grupo que acha que uma depressão se cura com uma garrafa de whisky e umas saídas com amigos. Não conseguia perceber o potencial de um diálogo em que construímos o edifício de nós próprios e, ao mesmo tempo, nos projectemos no futuro.
Em pouco tempo, levei duas lições de vida dadas pela mesma mulher - a Dra. Etelvina Brito era, realmente, uma mulher superior. Na sensatez como na inteligência, na forma como encaminhava as nossas conversas, como na maneira como ironizava sobre a vida. Uma mulher sábia.
Como seguramente não são, pelo menos nestes domínios, a cebeleireira, o taxista, o advogado, o empregado de café. Somos psicólogos uns dos outros? Parece que sim. Mas somos amadores. E os males da alma merecem maior cuidado. Atenção. E humildade. Quem sabe ouvir e tratar tem profissão, tem formação. Portugal psicoterapeuta? Nada disso. Apenas à deriva, a precisar de terapia."