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1001 pequenos nadas...

...que são tudo, ou apenas esboços da essência de uma vida entre as gentes e as coisas, captados pelo olhar e pela mente livre, curiosa e contemplativa. Por tudo isto e tudo o resto: É PROIBIDA A ENTRADA A QUEM NÃO ANDAR ESPANTADO DE EXISTIR

1001 pequenos nadas...

...que são tudo, ou apenas esboços da essência de uma vida entre as gentes e as coisas, captados pelo olhar e pela mente livre, curiosa e contemplativa. Por tudo isto e tudo o resto: É PROIBIDA A ENTRADA A QUEM NÃO ANDAR ESPANTADO DE EXISTIR

A felicidade

   «Um dia, eu e essa pessoa desconhecida vamo-nos encontrar por algum motivo e uma intuição talvez nos diga que chegámos à vida um do outro. Eu nem sempre acredito nisso. Mas não posso deixar de estar atenta. Aliás, sou mesmo assim, fico atenta a toda a gente. Gosto de olhar discretamente. Confesso. 

   Imagino a vida dos outros. Não é por cobiça. É por vontade que dê certo. Por exemplo, vejo alguém sem cabelo e invento que há gente que só gosta de homens carecas e então ser careca passa a ser uma vantagem ou, pelo menos, desvantagem nenhuma.

   Acho que invento a felicidade para compor todas as coisas e não haver preocupações desnecessárias. E inventar algo bom é melhor do que aceitarmos como definitiva uma qualquer realidade má. A felicidade também é estarmos preocupados só com aquilo que é importante. O importante é desenvolvermos coisas boas, das de pensar, sentir ou fazer.»

Valter Hugo Mãe, "O paraíso são os outros"

 

 

«O Ano Sabático», João Tordo

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Depois de treze anos de vida desregrada no Québec, Hugo, um contrabaixista de jazz, decide tirar um «ano sabático» e regressar a Lisboa, onde espera reencontrar o equilíbrio junto da família. Porém, logo numa das primeiras noites, assiste ao concerto de Luís Stockman - um pianista que se tornou recentemente famoso -, e a almejada paz transforma-se no pior dos pesadelos: Stockman toca um tema inédito que Hugo conhece bem demais, pois é o mesmo que vem escrevendo há anos na sua cabeça…
Quando o começam a confundir na rua com o pianista - e a própria mãe lança a dúvida sobre a sua identidade -, Hugo encetará uma busca obsessiva da verdade e do seu duplo, entrando num labirinto de memórias e contradições que o conduzirá a um destino muito mais funesto do que imaginara ao deixar Montreal. É nessa mesma cidade que Stockman desaparecerá, curiosamente, mais tarde, segundo nos conta o seu melhor amigo - o narrador deste romance - a quem cabe agora desmontar os acontecimentos, destrinçar fantasia e realidade e enfrentar as assustadoras e macabras coincidências que unem, como num espelho, a vida dos dois músicos.

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   Depois de um mês agarrada ao Limiar da Eternidade e de estar apenas a meio do livro, precisei de uma pausa naquelas mais de 1000 páginas de história. João Tordo foi o eleito. 

   Ao quarto livro de João Tordo livro começo a reconhecer-lhe um padrão de escrita. Um pouco esquizofrénico, diria eu... Não é propriamente um estilo que me agrade, mas tem aquele je ne sais quois que nos prende da primeira à última página. 

   Claramente, a Biografia Involuntária dos Amantes é, de longe, o seu melhor livro, mas vale a pena conhecermos toda a sua obra. 

Acredita sempre

   «Os filhos, conseguidos de uma forma ou de outra, são invariavelmente valiosos. Mães e pais, juntos ou separados, são sempre mães e pais e não perdem o amor. 

   Apenas as doenças fazem mães e pais perder o amor. Cientistas de todo o mundo procuram urgentemente uma cura. Mas não parece nada fácil. Creio que só uma esperança qualquer pode curar. 

   A esperança parece inventada pela espera. Eu não sei esperar. Todos os dias me assusto por não ter esperança. Quero muito ter. A minha mãe manda fazer um esforço. Ela diz: acredita sempre. Eu acredito, só não estou certa de saber ficar à espera. Quando for maior vou seguramente melhorar neste desafio."

Valeter Hugo Mãe, "O paraíso são os outros"

Vontade de grudar

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   «Os casais são criados por causa do amor. Eu estou sempre à espera de entender o que é. Sei que é algo como gostar tanto que dá vontade de grudar. Ficar agarrado, não fazer nada longe. Os casais são isso: gente muito perto. Quero dizer: acompanhado, porque mesmo em viagem não deixam de acompanhar, pensam o dia inteiro um no outro.

   Às vezes, falamos com alguém que pertence a um casal e essa pessoa nem ouve porque está a pensar em quem ama. Chega a ser bizarro. Quase mal-educado.»

Valter Hugo Mãe, "O paraíso são os outros"

O caso José Sócrates - do outro lado

   Eu não tenho qualquer interesse político em José Socrates ou qualquer outro politico ou politica. Na verdade, politica é daqueles assuntos que me passa completamente ao lado. Este filme todo à volta da prisão de José Socrates passou-me pelo mesmo lado que todos os outros, quanto mais não fosse porque temos uma televisão que nos martiriza com estes acontecimentos, ao ponto de já não sermos sequer capazes de olhar para um comando.

   No entanto, o que não me passa ao lado é a forma como o povo português tem lidado com esta situação. E o que é nós temos? Sátira e mais sátira, gozo e comentários que vão desde o "bem feito" até aos mordazes "devia era apodrecer na cadeia". Por todas as redes sociais ou meios de comunicação social há alguém (muitos alguéns!) capazes de fazer uma piada com a prisão de José Sócrates. O que está aqui em causa não é a culpa ou inocência do senhor. Se realmente é culpado e eu até acredito que sim, já que a justiça portuguesa não se iria atrever a prender alguém tão mediático sem provas seguras, tem de pagar pelo que fez. O que me faz confusão é a capacidade dos portugueses se alhearem de tudo o que está à volta. José Sócrates é culpado, roubou, deixou o país na miséria e agora toma lá uma carrada de insultos que bem mereces. E a família de José Sócrates, será que merece? Alguma vez o povo que o pôs no poder e que o deitou abaixo pensará que por detrás do aldrabão há uma pessoa com pessoas à volta que gostam dele? Que estarão provavelmente a sofrer nesta altura com tudo isto e a sofrer duplamente: por um lado a desilusão, a dor, a mágoa, a incompreensão, o sei lá que mais que lhes passará pela cabeça por terem descoberto que o pai, o filho, o sobrinho, o amigo, poderá ser culpado de vários crimes e por outro a revolta e a dor, talvez maior que a anterior, por todo o circo que se montou à volta de uma situação que de cómica não tem nada.

   É apenas isto que me faz pensar no caso José Sócrates: a desumanidade com que os portugueses lidam com ele. E a facilidade com que, mais uma vez, se esquecem da pessoa e das pessoas por detrás do "monstro".

SIm, eu posso pecar

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  Nunca como agora se deu tanta importância às questões do corpo e da nossa imagem. Há uma valorização excessiva destas questões, somos bombardeados com teorias, sugestões e proibições e a dada altura somos totalmente escravos do nosso corpo e da nossa saúde.

   Hoje dei por mim a pensar "Sábado vamos jantar fora, há pecados alimentares garantidos no jantar (apesar de ser um jantar do ginásio!), por isso toca a começar já hoje as restrições alimentares para compensar os pecados de sábado e mantê-las depois do jantar". Depois parei um segundo, racionalizei a coisa e pensei "mas isto é rídiculo! Doentio!". Ora eu tenho cuidados diários com a alimentação, treino sem excepção 3 vezes por semana, raramente cometo pecados alimentares a sério, não peso sequer 50 kg, porque raio é que estou preocupada com a possibilidade de comer uma francesinha,coisa que já não como há 6 meses?!? Doentio certo?

   Tenho de admitir que muitas vezes, demasiadas, caio nestas preocupações excessivas de "ai que eu comi uma batata frita deixa-me já saltar para cima da balança". É certo que me preocupo com o meu corpo, com a minha forma física, com a minha saúde; é certo que tento ter 1001 cuidados com a alimentação; e também é certo que não me permito faltar a um único treino e sempre que não consigo cumprir a minha rotina de desgaste me sinto mal. Esta é a pessoa que eu me tornei. Mas às vezes precisava de não ser tão controlada e ser capaz de pensar com a cabeça racional e não com a cabeça dos quilos. 

   O que está à nossa volta não ajuda. Revistas, livros, jornais, blogs, facebook, televisão...somos inundados com pressões emocionais, psicológicas e visuais para sermos perfeitos, termos o corpo perfeito e a boca perfeita. E quem nos diz isto é...perfeito! Ou pelo menos assim parece! Hoje em dia tudo nos faz mal, não podemos comer uma lista infindável de alimentos e restrição ou proibição parecem ser as palavras de ordem! E nós lá nos iludimos e vivemos a contar quilos e calorias e hidratos de carbono e o mais que nos venha à cabeça. Podemos realmente ser felizes assim? 

   Já várias vezes disse isto: ser saudável tem de surgir naturalmente em nós. Tem de ser um estilo de vida e não uma preocupação. E se a maioria das vezes eu já consigo ser naturalmente assim, sem sentir que estou proibida de comer ou fazer isto ou aquilo, há momentos em que fraquejo e que deixo de cometer um belo pecado alimentar com receio de engordar ou do mal que isso fará ao meu corpo, esquecendo-me que para mim os pecados alimentares são uma excepção e, por isso, completamente permitidos! 

 

 

 

 

 

 

Se eu ficar...

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E se estivessemos à porta da morte e pudessemos sair do nosso corpo, observar e conhecer tudo o que se passa à nossa volta, e escolher lutar pela vida, apesar de termos perdido quase tudo o que dá sentido à nossa vida ou partir?

As experiências de quase-morte estão mais que faladas, a possibilidade de sairmos do nosso corpo e nos vermos de fora tem sido mais que usada em cinema e livros, mas este filme não cai em banalidades, não torna ridícula esta possibilidade e leva-nos a pensar que, de facto, há pessoas que lutam pela vida com uma força sobrehumana, enquanto outras facilmente desistem de continuar a viver. O que fará a diferença entre elas? Não existirá realmente um qualquer nível de consciência que nos permita decidir em função do que temos do lado de cá?

Gostei. 

O amor constrói

 

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 «Reparo desde pequena que os adultos vivem muito em casais. Mesmo que não sejam óbvios, porque algumas pessoas têm par mas andam avulsas como as solteiras, há casais de mulher com homem, de homem com homem e outros de mulher com mulher. Depois, há casais de pássaros, coelhos, elefantes, besouros. Os pinguins sãoabsurdamente fiéis, quero dizer: há também casais de pinguins, e até de golfinhos. Tudo por causa do amor.

   O amor constrói. Gostarmos de alguém, mesmo quando estamos parados durante o tempo de dormir, é como fazer prédios ou cozinhar para mesas de mil lugares. 

   Mas amar é um trabalho bom. A minha mãe diz.»

Valter Hugo Mãe, "O Paraíso São os Outros" 

«O paraíso são os outros», Valter Hugo Mãe

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«Estou cada vez mais certa de que o paraíso são os outros. Vi num livro para adultos. Li só isso: o paraíso são os outros. A nossa felicidade depende de alguém. Eu compreendo bem. 

Mães, pais, filhos, outra família e amigos, todas as pessoas são a felicidade de alguém, porque a solidão é uma perda de sentido que faz pouca coisa valer a pena.

Na solidão só vale a pena tentar encontrar alguém. O resto é tristeza. A tristeza a gente respeita e deita fora. A tristeza a gente respeita e, na primeira oportunidade, deita fora. É como algo descartável. Precisamos de usar mas não é bom ficar guardada.»

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   Podia ser um livro para crianças. E é. Um livro de criança com mensagem para gente crescida. Um livro que está cheio de vida e amor. Um livrinho surpreendente, claramente para mantermos na cabeceira. E se me permitem, Valter Hugo Mãe no seu melhor. 

   Podia ser apenas um livro para crianças. Mas é um livro para a vida.

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