Sanidade
Sabes qual é a diferença?, continuou. É que, nos tempos de Cervantes, um homem como o fidlgo de la Mancha não era internado num hospital e medicado até ficar a babar-se num sofá com a l+ingua de fora. Podiam chamar-lhe louco, mas era livre de acreditar em si próprio. Já reparaste que vivemos, deste lado do mundo, em torno de um mito construído em contradição com o que vulgarmente se define por "sanidade"? Um homem crucificado, mortinho da silva, que ressuscita ao fim de três dias! Aí está a tua sanidade, a tua devastadora contradiçõ. Desafio qualquer um a explicar-me que raio é isso da loucura. (...)
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Sanidade, vociferou. Milhares de pessoas de joelhos rumo a Fátima, ou a Nossa Senhora de Guadalupe. Séculos de carnificinas em nome de um deus ou de outro, não importa. Cultos pejados de celebridades que acreditam em ficção científica. E nós no meio disto, reduzidos à conivência, não vá aquilo que pensamos desta farsa incomodar o vizinho. Temos de ser fortes, é o que dizem. Resisitir à tristeza, à melancolia. Construir diques para nos protegermos dos sentimentos. Esconder os doentes da cabeça nos manicómios. è preciso andarmos em filinha, caladinhos, a toque de caixa, ao ritmo que eles querem. Para terem a certeza de que nunca nos ergueremos acima desta vulgaridade.
"Ensina-me a voar sobre os telhado", João Tordo