"Faz de mim um bonsai"
"Ficar eternamente criança por vontade, nem que desse muito trabalho. Ser sempre assim, igual ao que fora a minha irmã. O único modo de continuarmos gémeas. Sabes, pai, se eu crescer e não crescer a Sigridur vamos ficar desconhecidas. Faz de mim um bonsai. Peço-te. Corta o meu corpo, impede-o de mudar. Bate-lhe, assusta-o, obriga-o a não ser uma coisa senão a imagem cristalizada da minha irmã. Vou passar a andar encolhida, dormir apertada, comer menos. Vou sonhar tudo o mesmo ou sonhar menos. Querer o mesmo a vida inteira ou querer menos. Querer o que queria ela. Se s bichos da terra não a deixam ser maior, se é verdade que a levam por inteiro, que fique ao menos eu, pelas duas, a ser igual, para não morrermos. No mínimo, devíamos ter enterrado muitas flores com ela. Que florissem. Porque não pode ver senão bichos e terra suja. Não colhemos flores, fomos egoístas."
«A Desumanização», Valter Hugo Mãe