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1001 pequenos nadas...

...que são tudo, ou apenas esboços da essência de uma vida entre as gentes e as coisas, captados pelo olhar e pela mente livre, curiosa e contemplativa. Por tudo isto e tudo o resto: É PROIBIDA A ENTRADA A QUEM NÃO ANDAR ESPANTADO DE EXISTIR

1001 pequenos nadas...

...que são tudo, ou apenas esboços da essência de uma vida entre as gentes e as coisas, captados pelo olhar e pela mente livre, curiosa e contemplativa. Por tudo isto e tudo o resto: É PROIBIDA A ENTRADA A QUEM NÃO ANDAR ESPANTADO DE EXISTIR

Porque a psicologia não está à mesa do café

   Uma notícia recente dá conta de um projecto de duas psicólogas do Porto que dão "consultas" na mesa do Café Ceuta. É um projecto interessante, sem dúvida, mas que peca por ser criado e realizado por duas psicólogas, que se identificam como tal e que por isso estão ali a fazer trabalho psicológico, por muito que afirmem que não fazem consulta psicológica, mas sim "escuta activa". A ordem dos psicólogos já veio condenar/criticar este projecto e eu tenho de concordar. Num país em que a psicologia é uma ciência tão maltratada e esquecida, acho que este projecto vem reduzir toda a complexidade do trabalho psicológico à mera conversa de mesa de café, que é tudo o que a psicologia não é. 

   Acredito que o facto de não ser realizada em contexto de consultório ajude a quebrar o gelo e a resistência de algumas pessoas, mas também acredito que o ser realizada num local público, com tanta exposição, poderá ter o efeito precisamente contrário, principalmente quando à mesa existe uma placa a dizer "psicóloga". Se tanta gente tem vergonha de consultar um psicólogo ("isso é para malucos"), estar à mesa com um, num locar público, piora um bocadinho as coisas. Acima de tudo tira-lhe a seriedade com que é necessário encarar todo o processo terapêutico, sim, porque é sempre um processo terapêutico, de ajuda, de descoberta, de exploração, de confrontação e nunca uma relação de amizade que se vai construindo à mesa de um café, por mais simpático e confortável que esse café seja. Questiono, por exemplo, como é que as duas partes envolvidas (a psicóloga e o "cliente") lidam e gerem as situações de grande exteriorização de sentimentos que são totalmente expectáveis que aconteçam no verdadeiro trabalho psicológico...como é que a técnica gere, por exemplo, um momento de choro ou desespero, em pleno café? E como é que a pessoa que chora se sentirá ao saber que está no limite da exposição interior com mais ou menos pessoas à sua volta a partilharem desse momento tão pessoal e intímo? 

   Ideia gira, volto a reforçar. Imensa gente precisa de alguém que as ouça. Completamente de acordo. O que está mal é ser realizado por psicólogas que se identificam como tal para praticarem a tal escuta activa. Realizado por outras pessoas, ou por alguém que não colocasse uma placa com "psicóloga" à frente, e aí sim, uma grande ideia.