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1001 pequenos nadas...

...que são tudo, ou apenas esboços da essência de uma vida entre as gentes e as coisas, captados pelo olhar e pela mente livre, curiosa e contemplativa. Por tudo isto e tudo o resto: É PROIBIDA A ENTRADA A QUEM NÃO ANDAR ESPANTADO DE EXISTIR

1001 pequenos nadas...

...que são tudo, ou apenas esboços da essência de uma vida entre as gentes e as coisas, captados pelo olhar e pela mente livre, curiosa e contemplativa. Por tudo isto e tudo o resto: É PROIBIDA A ENTRADA A QUEM NÃO ANDAR ESPANTADO DE EXISTIR

E Urgência sabem o que significa?

   Uma recente passagem pelo serviço de urgência do hospital central aqui da zona levou-me a reflectir que, das duas uma: ou os portugueses não sabem distinguir um hospital de um centro de saúde e enganam-se no caminho, ou não sabem qual o verdadeiro significado da palavra/situação "Urgência".Isto porque a dada altura da minha longa espera na sala de acompanhantes, a fila de "check-in" para a urgência era tal que ultrapassava a porta de entrada. Ora quando chegámos a uma urgência central e vemos fila à entrada estamos no direito de pensar "Mas isto é um hospital ou um centro de saúde?". Não era suposto, e já que estamos numa urgência, não existirem filas de entrada, isto porque os casos SUPOSTAMENTE são u-r-g-e-n-t-e-s e não tempo e muito menos saúde para filas? Pois enganam-se. Há tempo para filas e há até tempo para conversas animadas com o acompanhante ou com o coleguinha de caso urgente imediatamente antes ou depois.

   Com tudo isto, não admira que as urgências estejam sobrelotadas. E a culpa de quem é? As usual, do nosso sistema nacional de saúde. Porquê? Porque são é ele que define o que é e o que não é urgente, o que pode e o que não pode ser atendido numa urgência. Se a lição estivesse bem estudada, casos de urgência "o-que-eu-quero-mesmo-é-uma-justificação-para-não-ir-trabalhar" eram directamente encaminhados para a rua, com direito a ameaça com seringa de 30 cm, só de agulha (quanto a mim, só a palavra já me põe a correr). Gente a mais onde o pessoal técnico é sempre insuficiente resulta em horas de espera por um diagnóstico questionável, excesso de trabalho desnecessário e possível negligência dos casos verdadeiramente urgentes.

    Como em tudo na vida e como em muitos outros aspectos, os portugueses precisam de ser "educados a e para", deixando de desdenhar uma situação urgente que, felizmente, não possuem, porque um dia que ela bata mesmo à porta e não dê tempo para estar em filas, vão dar tudo, mas mesmo tudo para se verem livres dela.

 

E o que me faz mais confusão é perceber aquela atracção por um lugar que cheira a doença por todos os cantos. Um lugar que nos põe down, deprimidos, chocados e...doentes. Quem é que no seu perfeito juízo (e saúde) gosta de ir a uma urgência? Dica: Mal entram, primeira porta à esquerda, «Urgência de Psiquiatria».

(Meu triste) Fado

   O fado é um estilo musical tradicionalmente português. No fado canta-se o amor, as desventuras, os acontecimentos diários...mas (quase) sempre num sentido contemplativo. Um estrangeiro que ouça os nossos fados dirá concerteza que é muito bonito, mas também é certo que dirá só é pena ser tão triste.

   O fado parece ser um belo exemplo da forma como os portugueses se organizam: experienciam os acontecimentos, pensam e sentem, mas depois parecem ficar aí bloqueados. Parecem não ser capazes de integrar de uma forma activa, os acontecimentos e as suas reacções aos mesmos. As suas estratégias parecem passar mais pela contemplação da tristeza do que pela sua superação. Às vezes, parece mesmo existir um culto da tristeza, como se esta fosse acarinhada e cultivada enquanto elemento organizador da identidade, como se a única resposta possível fosse a resignação ao destino, ao "fado", como se nada mais houvesse a fazer. Falta-nos, a nós portugueses, uma filosofia de produtividade e dinamismo que nos liberte da muleta do destino, que é sempre e só um triste fado nosso.

 

Adaptado após leitura de "Saúde Mental - do tratamento à prevenção"

Na solidão da leitura revelam-se

   Os portugueses são um povo com um muito fraco hábito de leitura. Portugal é um dos países da Europa com os mais elevados índices de iliteracia. É também o país em que menos jornais e revistas se vendem (aqui, as revistas ditas do "jet set cor-de-rosa" devem ser as melhores cotadas, dado o elevado grau de interesse dos portugueses pela vida alheia, principalmente se incluir desgraça - "Coitadinhos!!!" - ou se incluir luxo exacerbado - "Grrr, que inveja!!!"), em que as editoras menos editam e vendem e em que, ao viajarmos de comboio, metro ou autocarro, menos pessoas se vêem a ler. 

   As questões económicas poderão até ser consideradas e responsabilizadas, mas não servem de desculpa total, uma vez que, se pensarmos nos telemóveis, por exemplo, cada português terá até mais do que destes aparelhos, bastante mais dispendiosos, na compra e nos gastos inerentes ao seu uso. 

   Ora um livro lido recentemente (e ler vem mesmo a calhar para este post) sugere que os hábitos de leitura pobres dos portugueses poderão estar relacionados com aquilo que é a essência da leitura: um momento em que o indivíduo fica sozinho, em silêncio, perante o objecto de leitura. Precisamente, o acto e o processo de leitura implicam que o indivíduo tenha desenvolvido a capacidade de estar sozinho, de gerir o seu mundo interno e os estímulos do mundo externo, de forma a conquistar uma atitude de disponibilidade que lhe permita envolver-se no processo de leitura, que lhe permitsa desligar-se dos estímulos externos, ficar só consigo para se voltar para uma série de outros mundos para os quais a leitura nos empurra. Estar a sós com um livro convida-nos a uma postura reflexiva e pôe-nos em contacto connosco mesmo. Um contacto que pode ser assustador quando nos encontramos desorganizados e não gostamos do que somos.

   Será que os portugueses não gostam do que lêem ou não gostam do que são?