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Não gosto de sair de casa. De fazer uma mala, colocar para lá pedaços do que são e partir. Não me entendam mal; é óbvio que gosto de ir de férias e adoro conhecer locais novos, mas o saber que vou deixar "o meu espaço" por um determinado número de dias deixa-me um tanto nostálgica e ali num misto de aborrecimento e tristeza. De maneiras que no momento de voltar a casa nunca sofro daquele síndrome de "oh não, não queria nada que isto terminasse". Volto a casa e volto sempre satisfeita, carregada de recordações.
Não me perguntem a explicação para tal, afinal eu sempre me considerei uma "sem raízes" e para além disso ir de férias é uma espécie de vou ali e volto já, sem despedidas ou partidas definitivas. Certo é que a mim me desperta uma série de sentimentos e sensações pouco agradáveis, ao ponto de quase me fazer sentir que, afinal, não quero ir a lado nenhum.
Talvez, por mais que isso seja difícil de admitir para o meu coração de gelo, eu tenha mais raízes do que admito. Talvez até eu seja mais "apegada" às coisas e às pessoas do que realmente julgo. E talvez, talvez, o meu lugar seja mesmo aqui. Afinal, por muito grande que seja a nossa mala é impossível lá transportar tudo aquilo que somos. Ou tudo aquilo que faz aquilo que somos.
Já dizia o outro...Home is where they understand you...
Às vezes sinto que nós, psicólogos, estamos ali para fazer o que os pais não conseguem/não sabem/não querem fazer, o que nos coloca numa posição que, a meu ver, é bastante ingrata, porque parece rotular-nos assim como uma espécie de sabe tudo da boa educação, do bom viver ou da perfeição. Isto cria expectativas nas outras pessoas, como se o facto de termos determinada profissão tornasse absolutamente impossível e intolerável certos e determinados comportamentos em nós e nos que nos são próximos, afinal só passamos os "bons exemplos".
Ora isto fez-me pensar até que ponto a profissão dos pais cria expectativas em relação ao comportamento e temperamento dos filhos. Assim alguns exemplos:
É de esperar que o filho de uma educadora de infância seja uma criança exemplarmente educada e estimulada?
É de esperar que o filho de um professor de matemática seja o vencedor das olimpíadas da matemática?
É de esperar que o filho de um desportista seja tudo menos obeso?
É de esperar que o filho de um médico seja um poço de saúde e vida saudável?
É de esperar que o filho de um jurista ou advogado siga as regras à risca?
É de esperar que o filho de um escritor adore ler?
...
É de esperar que o filho de um psicólogo seja uma criança "modelo", em termos de disciplina, autocontrolo, emoções, educação e tudo aquilo que os outros pais nos pagam para transmitirmos aos seus filhos?
Enquanto filha de pai engenheiro civil não sei se era suposto gostar de prédios e estradas, mas não gosto. Já das matemáticas, uma das principais disciplinas da área, nunca fugi e sempre consegui resultados positivamente bem longe do panorama nacional. E fica por aqui o que de engenharias corre no meu sangue.
Enquanto mãe nada tenho a acrescentar, já que a experiência na área é nula. E embora a maternidade não faça parte dos meus planos, muitas vezes dou por mim a pensar que, pela minha profissão, muito boa gente poderá colocar a fasquia da educação de um potencial filho muito alta, não lhe dando margem para qualquer pequeno desvio. Aliás, tenho um exemplo na família. Um tio psicólogo que embora passe uma educação exemplar aos seus filhos, deixa um tanto a desejar no que a práticas educativas e parentais diz respeito. E o comentário que chega de quem assiste do lado de cá é sempre o mesmo e sempre proferido com a maior das admirações: "E o pai é psicólogo!"
A questão é:
terão os nossos filhos de ser um reflexo das nossas profissões?